A realidade virtual (VR) é uma tecnologia ativa que se utiliza de elementos computacionais para criar um ambiente passível de interação. Além da sua utilização na área de vendas, há uma tendência para o mundo da aprendizagem. Será que esta inovação transformará a maneira como hoje desenvolvemos nossas cognições e conexões cerebrais?
No dia 08/05 o programa Mundo S.A., da Globo News, trouxe como tema a Realidade Virtual e ele vai nos ajudar neste processo de análise e considerações.
Já tive a oportunidade de comentar em pequenas linhas sobre este assunto no artigo Tendências para Educação Corporativa, escrito ainda em 2016.
Pois bem, não há como negar que a realidade virtual, em inglês virtual reality ou simplesmente VR, é uma inovação tecnológica com grande potencial e cifras bem interessantes. Apenas para se ter uma ideia, de acordo com a Maria Prata (Mundo S.A.), o mercado de VR atual movimenta cerca de US$ 5.2 bilhões e sua tendência para os próximos quatro anos é que chegue em torno de US$ 160 bilhões.
Além disso, almeja-se que até 2018 haja em torno de 171 milhões de usuários ativos nesta tecnologia.
Com tantas expectativas para esse negócio é muito bom, não é mesmo?
Antes de qualquer afirmativa positiva ou negativa, penso que precisamos analisar com mais cautela. Obviamente que o foco que darei nestas linhas é o voltado ao desenvolvimento do capital humano.
Portanto, gostaria de lhe convidar a aprofundar-se comigo no aspecto da aprendizagem, combinado?
Realidade virtual como apoio para o processo de aprendizagem
Já dissemos em outros momentos que a forma de ensino e aprendizagem mudou. (Para saber mais sobre esta mudança, recomendo este Podcast).
Neste contexto, uma das grandes apoiadoras desta evolução e inovação é a tecnologia.
A tecnologia fornece o suporte para que possamos chegar a outros níveis cognitivos. Nos possibilita criar um ambiente favorável a metodologias ativas e experiências significativas para o desenvolvimento integral do ser humano.
O problema inicia quando deixamos de entender a tecnologia como meio e passamos a aplicá-la como o fim. Além disso, outro grave equívoco é esquecer de planejar o ambiente de aprendizagem e simplesmente aplicar modelos que são os “queridinhos da vez”.
Quem não se lembra do “potencial milagroso” da storytelling, da gamificação ou mesmo das videoaulas?
O discurso até então era: basta você criar um vídeo, contar uma história, “subir” para a web e fazer com que a equipe assista (metodologia passiva) para que esta aprenda e mude o seu comportamento. Contudo, o desenho, a análise e a verificação desta ação, em muitos momentos, nem são cogitados, o que importa é o fazer e disponibilizar. Depois, caso não dê resultado, então, elimina-se ou é refeito.
Você já ouviu este tipo de discurso?
Obviamente, que quando tratamos de aprendizagem a realidade não é tão simples assim. Afinal, nem todos aprendem da mesma forma e nas mesmas circunstâncias, você concorda?
Caso fôssemos “robôs” ou replicadores de informações, todos, sem exceção, ao sermos submetidos a um determinado conteúdo teríamos o mesmo resultado.
Assim, quero enfatizar sobre os dois problemas que listei acima:
A tecnologia deixar de ser o meio e passar a ser o fim e aplicar modelos sem planejamento
Há informações disponibilizadas na web evidenciando que o simples fato de construir um curso online, criar um jogo, aplicar simulações ou gamificação são a chave do sucesso. Você, sinceramente, acredita que isso é uma verdade absoluta?
No ano de 2016 concluí uma pós-graduação numa faculdade de engenharia e tecnologia e tive o prazer de ter como professor o ilustre José Moran. Dentre tantos ensinamentos dele, teve uma frase que me marcou. Ele disse mais ou menos isso:
… as possibilidades, falando em tecnologias ativas, são infinitas, por isso, veja tudo isso que se apresenta como se fosse um “à la carte”.
Não querendo ser redundante, mas esse é o papel de todas as inovações tecnológicas, servir como opções para atingir os objetivos planejados de desenvolvimento.
O que quero dizer é que o simples fato de desenvolver um treinamento com simulações ou mesmo com a realidade virtual, não é garantia de aprendizagem efetiva.
Por quê utilizar apenas uma metodologia não é garantia de aprendizagem efetiva?
Vamos a um exemplo real: atualmente, aqui no Brasil, para conseguir a licença para dirigir no território nacional, ou seja, ter a carteira de motorista, o candidato é submetido a:
exames médicos e psicológicos
aulas teóricas (englobando leis de trânsito e primeiros socorros)
prova teórica
simulações de dirigibilidade em situações de risco (chuva, embriaguez, neblina, etc.)
aulas práticas
prova prática
Não entrando no mérito se é justo que somente os novos motoristas passem por tudo isso, se há uma relação direta desta formação com a diminuição ou aumento de acidentes veiculares, imagine submeter os candidatos apenas às simulações de dirigibilidade.
Você acredita que o resultado no desenvolvimento desta nova competência seria satisfatório?
Neste ponto entramos no segundo problema. Em muitos momentos é esquecido o pensar na arquitetura e engenharia do produto educacional a ser desenvolvido. Não se leva em consideração aspectos mínimos envolvidos como: contexto, audiência e gap de competências.
Impacto da utilização da realidade virtual em programas de desenvolvimento humano
Voltando ao programa do Mundo S.A., veja que interessante a visão de Reinaldo Sakis, gerente de pesquisas do IDC:
O uso da realidade virtual também não é algo para que se permaneça horas utilizando. […] com a utilização pelo usuário de 10 horas desta tecnologia, será analisado os impactos.
Este impacto que ele se refere é sobre o nosso cérebro, conexões, sinapses e pensamentos. Por quê?
Veja, a VR age enganando o nosso cérebro.Vamos entender melhor o processo natural.
As imagens que captamos diariamente levam até o cérebro informações de onde estamos, para onde vamos, se há perigo eminente etc. Temos outros sentidos que atuam em conjunto para posicionar o cérebro sobre a situação atual, além da visão: olfato, audição, paladar e tato.
No caso das pessoas que possuem alguma deficiência, como a visual, por exemplo, os demais sentidos se sobressaltam para que elas não sejam tão prejudicadas. Certamente, que não é tão simples e que exige treino, além do bom senso das pessoas, ditas normais, em ajudar neste processo.
Aqui vale um adendo, somos criaturas tão perfeitas e nosso cérebro é tão interessante, que a própria neurocientista Suzana Herculano diz que tem que haver um Ser que pensou nisso. Não é só evolução!
Observação realizada, vamos voltar à neurociência!
Como a realidade virtual funciona?
Ela necessariamente precisa de um equipamento, especificamente neste modelo vigente, óculos, que possua um software acoplado nele.
Quando o usuário coloca o óculos e o “cenário roda” via software, estímulos elétricos avisam o cérebro que você está naquele local. Por isso é possível interagir com o ambiente, ver 360º, andar, correr, tocar, enfim, estar de fato naquele ambiente criado via tecnologia computacional.
Por estes motivos que o Reinaldo Sakis alerta que ainda não sabemos o real impacto de várias horas de imersão nesta tecnologia.
Cases demonstrados no programa Mundo S.A.
Então, não é recomendável utilizar a realidade virtual?
Como disse anteriormente, não podemos simplesmente louvar ou crucificar. Nem tudo é 100% ruim ou 100% bom.
No próprio programa, o qual deixo o link nas referências bibliográficas, há exemplos importantes do uso da VR. Por exemplo, no hospital Sírio-Libanês, onde há um programa, no departamento de otorrinolaringologia, para auxiliar pessoas com desequilíbrio a treinar o cérebro para voltar à normalidade.
Outro exemplo bem bacana é de uma agência que vende pacotes de viagens, onde, com o auxilio desta tecnologia, é possível estar no destino desejado sem sair da empresa.
Assim, o cliente interage com pontos turísticos e rede hoteleira, para ter certeza que é o lugar que deseja conhecer.
Aqui mesmo no Brasil, a Cyrella está se utilizando desta tecnologia para que seus potenciais clientes possam interagir com os empreendimentos sem precisar que o imóvel esteja pronto. Essa experiência para o futuro comprador vai muito além de visitar um apartamento decorado.
São exemplos de sucesso porque conseguiram entender as facilidades e inovações da tecnologia, sem deixar de lado outras metodologias que a assessoram.
Considerações sobre a realidade virtual
Por atuar com inteligência corporativa e inovação, sou totalmente a favor do investimento em tecnologias ativas imersivas. Todavia, estas precisam fazer sentido para o todo e estarem dentro de um projeto maior que entenda e defina o caminho da aprendizagem aos submetidos a esta experiência.
Assim como precisamos discernir se é ético e salutar adotar um robô para ser chefe na sua empresa, há a necessidade de entender até onde é estratégico utilizar a realidade virtual como fonte de aprendizagem.
Caso queira compreender um pouco mais sobre as metodologias ativas, inteligência corporativa, inovação, gestão do conhecimento e aprendizagem, conheça o Programa Innovare da Conducere.
Além disso, é muito relevante saber: qual é a sua opinião sobre este assunto?
Julgue sempre uma nova situação com sabedoria e não se deixe influenciar por filosofias que não centram na pessoa humana como o seu diferencial. Lembre-se:
É a malícia que perverte o julgamento, a perfídia que seduz a alma. Pois a fascinação das frivolidades obscurece o bem e a vertigem da paixão perverte o espírito inocente (Sabedoria 4, 11-12).
Será que a realidade virtual consegue, de verdade, ser a solução para o desenvolvimento das pessoas da organização?
Compartilhe suas considerações conosco, deixando o seu comentário!
Grande abraço e que Deus sempre te abençoe e te dê o discernimento necessário!
Referências bibliográficas
BÍBLIA DE JERUSALÉM. Paulus: São Paulo, 2002.
GLOBO NEWS. Realidade Virtual. Programa Mundo S.A., 2017. Versão reduzida disponível em: <http://g1.globo.com/globo-news/mundo-sa/videos/t/mundo-sa/v/mundo-sa-mercado-da-realidade-virtual-tem-potencial-para-crescimento/5855724/>. Acesso em: maio de 2017.
Observação importante: para assinantes da Globo News é possível ver o programa completo via Globo News Play.
SALVADOR, Jocelito André. Que tal adotar um robô para ser chefe na sua empresa?, 2016. Disponível em: <https://conducere.com.br/que-tal-adotar-um-robo-para-ser-chefe-na-sua-empresa/>. Acesso em: maio de 2017.
___________, Valeska Schwanke Fontana. Design Instrucional e sua relação com outras inovações educacionais, 2016. Disponível em: <https://conducere.com.br/design-instrucional-conectando-inovacoes-educacionais/>. Acesso em: maior de 2016.
___________, ___________________. O que é tendência para a educação corporativa nos próximos anos, 2016. Disponível em: <https://conducere.com.br/tendencia-para-educacao-corporativa/>. Acesso em: maio de 2017.
Referência de imagens
Freepik. Vetores manipulados pela Conducere. Disponível em: <http://www.freepik.com/>. Acesso em: maio de 2017.
Google imagens. Simulação de dirigibilidade, 2017. Disponível em: <http://www.sitedelinhares.com.br/noticias/geral/mpf-es-pede-suspensao-da-exigencia-de-simuladores-de-direcao-veicular-em-autoescolas>. Acesso em: maio de 2017.
Google imagens. Simulador de direção à noite, 2017. Disponível em: <https://shopinfo.wordpress.com/2011/04/18/simulador-de-direcao-nas-auto-escolas/>. Acesso em: maio de 2017.