O pensamento sistêmico é uma das grandes fontes para a inovação nas organizações. Através dele há um processo legítimo de aprendizagem continuada.
Preparando-me para alguns projetos de clientes, assim como evoluindo o meu projeto de mestrado,fui aprofundar-me nas ideias de Peter Senge sobre o pensamento sistêmico (quinta disciplina) e os aspectos relacionados à gestão do conhecimento e inovação.
Tal processo já começou bem interessante. Ao buscar a edição revista pelo próprio SENGE, ainda em 2005, quinze anos após a edição original da obra, ele faz duras críticas às organizações que insistem em trabalhar por eventos. Tais organizações acabam analisando as relações de causa e efeito, diretas, dos seus “problemas”, sempre buscando a transferência de responsabilidade etc., dentro de um pensamento linear, definido por ele mesmo, e não sistêmico.
Pensamento sistêmico: uma necessária mudança de mentalidade
Ao analisar estes aspectos, faço questão de destacar um pequeno trecho do capítulo intitulado Uma mudança de mentalidade, para iniciarmos a nossa reflexão:
Difícil discordar das ideias do autor, justamente nós que vivemos no século XXI, em plena era digital e do conhecimento, não é mesmo?
Por outro lado, é extremamente comum, em especial quando se fala da formação de líderes e equipes, o desejo que muitos administradores/empreendedores têm que suas equipes efetivamente tenham o almejado “pensamento sistêmico”.
Por que temos tantas dificuldades de ter um pensamento sistêmico?
Pensando exatamente neste ponto, comecei a refletir sobre as razões pelas quais temos, ao menos a maior parte de nós, dificuldade de ter um “verdadeiro” pensamento sistêmico e procurei rascunhar algumas questões que me pareceram fazer sentido:
Vivemos, até meados do século XX, num mundo muito menos complexo do que o que hoje se apresenta, mas desde muito cedo aprendemos a segmentar nosso pensamento.
A segmentação clássica do pensamento começa na escola tradicional, onde aprendemos matemática, química, física etc., como se fossem disciplinas totalmente separadas e independentes entre si.
Tal segmentação segue durante a vida adulta ao ingressarmos num determinado curso superior. Você já se deu conta que embora a sua faculdade faça parte de um centro maior, por exemplo, Ciências Sociais Aplicadas, ela não se relaciona com as demais do mesmo centro? Neste caso citado, quem faz Ciências Contábeis é praticamente rival de quem faz Administração, que por sua vez, não coaduna seus pensamentos com o pessoal da Economia, muito menos com o pessoal lá do Direito e nem pensar com aquele povo da área de Comunicação.
Essa total separação de áreas de conhecimento continua na vida profissional. Você já pensou por quantos médicos especialistas você tem que passar para fazer um simples check up completo da sua saúde?
Obviamente que há sistemas (como o corpo humano), que de tão complexos, tornam praticamente impossível que apenas uma pessoa domine com profundidade todas as suas áreas de conhecimento.
De qualquer forma, será que esta hiperespecialização, em determinadas áreas do conhecimento, pode acabar por “engessar” nossos modelos mentais?
Creio fielmente que sim, muito embora também não acredite que profissionais extremamente generalistas possam efetivamente resolver nossos problemas mais complexos.
Assim, tenho me conscientizado, cada vez mais, que uma evolução do nível de conhecimento da humanidade pode dar-se através da aprendizagem em equipe. O que não é tão simples quanto pode parecer num primeiro momento.
Será que as técnicas que utilizamos para o desenvolvimento da equipe são eficazes?
Aliás, você sinceramente acredita que o simples fato de reunir 20 ou 30 pessoas numa sala de aula, numa palestra, num treinamento vivencial, numa convenção de vendas vai fazer com que elas passem a ter uma visão “mais compartilhada” e com isso passem a trabalhar efetivamente em equipe?
Fala-se muito em educação continuada, mas continuam sendo aplicados treinamentos pontuais nas organizações, de um modo geral.
Fala-se em educação corporativa e gestão do conhecimento. Contudo, privilegiamos palestras e convenções de vendas ao invés de investir no diálogo entre as pessoas e em espaços onde o conhecimento das mesmas possa efetivamente ser criado e propagado.
Fala-se muito em pensamento sistêmico nas organizações, mas continuamos privilegiando o desenvolvimento de algumas pessoas, apenas, dentro das organizações. Normalmente, são elas líderes ou participantes da equipe comercial, ou quem sabe da equipe de engenharia.
Procuramos por soluções quase mágicas no mercado. Queremos que o nosso RH se transforme em Estratégico, que os nossos líderes sejam efetivos Coachs, que os nossos talentos sejam desenvolvidos e retidos. Por fim, queremos que efetivamente tenhamos uma empresa totalmente inovadora.
As disciplinas apresentadas por Peter Senge
Creio que, como você já se deu conta, não vivemos num conto de fadas, e por isso é imprescindível que tenhamos, trazendo à tona novamente a teoria de SENGE:
Domínio pessoal: a mudança começa por nós mesmos, não tem jeito. Precisamos “dominar” as nossas competências mais básicas como verdadeiros seres humanos. Refiro-me à capacidade de indagação e reflexão. Não é tão difícil assim, como diria o grande São Francisco de Assis: “comece fazendo o que é necessário, depois o que é possível e de repente você estará fazendo o impossível.”
Modelos mentais adequados à nossa realidade: precisamos quebrar constantemente os paradigmas estabelecidos, sejam eles nossos ou criados na cultura da nossa organização, ou mesmo da nossa sociedade. Obviamente, quebremos apenas aqueles paradigmas que paralisam a nossa evolução contínua, pois do contrário ficaremos sem referências a serem seguidas e então o problema será ainda maior.
Visão compartilhada: de fato uma empresa, ou qualquer outra organização, não sobreviverá se cada pessoa da equipe, que dela faz parte, quiser levá-la a um objetivo ou local diferente.
Aprendizagem em equipe: precisamos conseguir aprender individualmente e também em equipe para que, realmente, a soma de todo o conhecimento individual, que está em cada pessoa, seja menor do que o conhecimento gerado pela equipe reunida. Naturalmente, tal aprendizagem precisa ser contínua para que a organização sobreviva.
Pensamento sistêmico: é preciso que haja integração entre as chamadas disciplinas essenciais (domínio pessoal, modelos mentais, visão compartilhada e aprendizagem em equipe) para haver o verdadeiro pensamento sistêmico em detrimento ao pensamento linear.
Posso lhe dizer, com tranquilidade, que ao analisar com mais profundidade os aspectos que refletimos até o momento, fico cada vez mais convencido de que as empresas que adotam um Sistema de Educação Corporativa e de Gestão do Conhecimento, real, verdadeiro, não um faz de conta, tem uma oportunidade grandíssima de implantar o pensamento sistêmico na sua cultura organizacional.
A gente ainda vai falar sobre isso em outros momentos. Meus estudos continuam e estão focados em avaliar como o conhecimento e a formação das competências essênciais (core competences) podem criar, ou ao menos facilitar, o processo de inovação nas empresas, fazendo com que elas permaneçam competitivas ao longo de toda a sua vida.
Como isso ocorre na prática?
Será isso somente uma lenda urbana ou é possível adotarmos práticas nas nossas empresas, mesmo que tenham um pequeno ou médio porte, para que se privilegie a tríade aprendizagem – conhecimento – inovação?
Não quero antecipar aqui o que certamente dará mais um artigo, mas pelo que pude constatar até então, o processo de aprendizagem gera conhecimento, que por sua vez é a base de formação das competências essenciais e que por fim teremos a tão esperada inovação contínua.
Ah, o melhor é que tudo isso está acessível para todas as organizações.
Contudo, isso é cena para os próximos capítulos!
Conducere Indica – Podcast sobre pensamento sistêmico
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Bibliografia
SENGE, Peter. A quinta disciplina: A arte e a prática da organização que aprende. Trad. Gabriel Zide Neto, OP Traduções. 31ª edição. Rio de Janeiro: BestSeller, 2016.